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Marco Neves um “Serrano Algarvio” apaixonado pela fotografia

Saiu de Seia há já alguns anos e estabeleceu-se em Albufeira, onde reside há cerca de 16 anos. É professor de Biologia e Geologia e um apaixonado pela fotografia de natureza, astrofotografia e, mais recentemente, da vida selvagem. De quando a quando desloca-se a Seia, região serrana que já foi, naturalmente, o seu teatro fotográfico. Chegou a dar aulas em São Romão e Mangualde, durante cerca de 3 anos, o que lhe permitiu usufruir da “magia da Estrela em todas as épocas do ano.” Recentemente ganhou o primeiro lugar no concurso de fotógrafo de natureza – categoria Paisagem, no Festival de Imagem e Natureza de Vouzela, com a fotografia “A Falésia”.

Conheça toda a história de Marco Neves, nesta entrevista que concedeu ao JSM.

Marco Neves (MN): É uma realidade: acho que, neste momento, já me posso classificar como um «Serrano Algarvio», uma vez que tenho quase tantos anos de Algarve, como os de vida em Seia. A escolha de Albufeira para residência nos últimos cerca de 16 anos prende-se com a necessidade de estabilidade pessoal e profissional que procurei, juntamente com a Cláudia, minha esposa. Sendo ambos professores de Biologia e Geologia, procurámos colocação de lés a lés durante inúmeros concursos instáveis que nos obrigavam, quase sempre, a ficar distantes e a mudar de escola praticamente todos os anos. E foi precisamente no Algarve que conseguimos a estabilidade almejada para começar a construir algo que pudéssemos sentir como a nossa casa.

A escolha da Biologia enquanto área de formação académica não terá sido ocasional, uma vez que sempre senti um forte apelo do mundo natural. O que significa que muito do tempo disponível para o lazer acaba por ser despendido em plena comunhão com o ar livre, em atividades como a pesca, a fotografia, a observação de aves ou as caminhadas.

MN: Posso dizer que são muito diferentes mas também muito iguais. Esclarecendo, iguais no sentimento que já criei, por ambas as regiões, uma natural ligação emocional muito forte a Seia, pela família, amigos, pelas nossas origens, e uma relação emocional em crescendo com o Algarve, enquanto nosso lar atual, com tudo o que isso implica. Em termos das regiões em si, para alguém que adora explorar o meio natural, é um privilégio enorme poder usufruir de, tempos a tempos, destes dois mundos tão distintos, com paisagens e seres vivos tão diferentes, climas quase opostos, cores, texturas, cheiros… tudo tão contrastante, mas ao mesmo tempo tão idêntico pelo estímulo de exploração que a sua natureza nos cria. 

MN: Não sei precisar muito bem. Lembro-me apenas de ser criança, talvez uns 7/8 anos, e de já ter esse fascínio pela máquina fotográfica dos meus pais: uma Kodak Instamatic! Aquele aparelho era uma das coisas mais mágicas que poderiam existir na vida de uma criança do início dos anos 80! Para já, toda a morosidade do processo: tirar uma fotografia era quase um momento solene, tal a gestão que tínhamos que fazer consoante o tamanho do rolo fotográfico.

Além disso, à pergunta “Mãe, pai, posso tirar uma fotografia?”, muitas vezes a resposta era negativa, porque era necessário gerir o número de fotos disponíveis, tornando o momento em que, finalmente, podíamos fazer um disparo como um prémio pelo qual há muito se ansiava. E depois, dependendo da vida familiar e social das semanas e meses seguintes, esperávamos quase sempre longos períodos de tempo até se poder levar o rolo para revelar. A esta distância, parece um mundo muito longínquo e quase surreal, mas eram estas pequenas coisas que nos levaram a aprender a esperar, a valorizar as pequenas conquistas, algo que, na velocidade consumista do mundo tecnológico de hoje em dia, não tem lugar. Consumimos tudo demasiado depressa e não aprendemos a valorizar o que vivenciamos.

Assim, sempre fui um interessado pela fotografia, mas não de uma forma metódica ou muito científica, sempre, principalmente, para os registos familiares e sociais. Com a passagem para a vida adulta começaram a existir fases de maior investimento enquanto atividade de lazer, principalmente quando o meio natural que explorava me entusiasmava ao ponto de voltar a pegar na máquina fotográfica. E, a partir daí, sempre se tornou um complemento das minhas vivências e deambulações, principalmente para registar as paisagens e os locais. Neste percurso foram surgindo pequenos focos de interesse, consoante áreas que me iam apelando, talvez pelos diferentes estímulos dos sítios onde vivi enquanto professor. Talvez por isso me tenha interessado pela paisagem natural, pela astrofotografia e, nos últimos tempos, pela vida selvagem, mais concretamente pelas aves.

MN: Confesso que quando vimos até Seia, o tempo disponível para a fotografia acaba por ser reduzido, uma vez que as visitas, como é natural, têm como foco principal usufruir da família e dos amigos que estão distantes a maior parte do ano. Ainda assim, com a minha recente incursão pela fotografia de vida selvagem, nomeadamente de aves, ocasionalmente acontece deixar toda a gente a dormir e aproveitar as primeiras horas da manhã algures na montanha ou pelas ribeiras e rios à procura da bicharada. Ou então, depois de jantar, subir até à Estrela para umas fotografias do céu noturno.

MN: Esta região já foi, naturalmente, o meu teatro fotográfico. Cheguei a dar aulas em São Romão e Mangualde, durante cerca de 3 anos, o que me permitiu usufruir da magia da Estrela em todas as épocas do ano. É incrível como podemos subir e descer a montanha dezenas de vezes e é impressionante como temos sempre a sensação que nunca há um dia igual. A dinâmica do clima, os seres vivos, as cores, as texturas, há sempre algo em mudança. E, no fundo, é isto que torna a natureza tão fascinante.

MN: A mais difícil é aquela que ainda não se conseguiu fazer. E a fotografia de bichos tem um pequeno «problema»: eles mexem-se. Muito! O que torna tudo muito mais difícil, desafiante, mas também aliciante! E talvez seja isso que está a tornar a fotografia, neste caso de vida selvagem, tão presente na minha vida como nunca esteve antes.

Tenho uma foto em mente, com uma ave quase microbiana, a felosinha, que tenho observado e fotografado de vez em quando em ecossistemas lagunares de Albufeira. E a cena que idealizei depreende que a apanhe em voo, a caçar mosquitos, com um fundo específico e a uma hora do dia que me permita uma boa contraluz… a juntar a tudo isto, esta ave é incrivelmente pequena, rápida e de voo altamente imprevisível! Portanto…talvez lá para 2058 consiga a minha imagem. Mas é exatamente este tipo de desafio e estes objetivos que surgem da observação dos comportamentos animais, que tornam apaixonante a fotografia de vida selvagem. 

E senti que vivia já intensamente a paixão por este tipo de fotografia quando há cerca de um ano, pela primeira vez na vida, dei por mim completamente sozinho nas margens de uma lagoa a emitir um grito espontâneo de celebração por ter tirado uma fotografia

Foi um momento de total êxtase: andava há vários dias a fotografar corvos marinhos na Lagoa dos Salgados, principalmente com o objetivo de os apanhar em momentos de ação, seja em voo, seja a seguir à captura de um peixe. Tinha já algumas boas fotografias deste corvo nas suas sessões de pesca submarina, com aquela luz dourada fantástica de final de dia. Mas foi aí que surgiu na mente a fotografia seguinte: e tentar apanhar isto com o sol ao contrário, logo pela manhã, em contraluz? O potencial para uma boa fotografia de ação desenhou-se na minha cabeça. Naturalmente nunca pensei nesta exata fotografia, uma vez que a posição da enguia, da ave… são tudo variáveis absolutamente incontroláveis e que nenhum fotógrafo de vida selvagem pode prever. Aliás, quando um corvo mergulha para caçar, nunca sabemos se vai apanhar peixe, não sabemos em que sítio vai emergir, é tudo altamente imprevisível e muito rápido.

Mas quando acabei de disparar uma sequência de fotografias, vi a posição da ave, da enguia enrolada, com a barbatana dourada em contraluz, os salpicos de água a dar uma dinâmica de ação incrível…foi mesmo aquele momento “UAU” que nunca tinha sentido em fotografia! E, possivelmente por todo este enquadramento e dificuldade, terá sido a que me deu mais gozo tirar, tendo inclusivamente sido premiada pela Rewilding Portugal em 2024, com um segundo lugar na categoria Fauna. 

MN: Essa é uma pergunta difícil. Porque a fotografia transmite emoções. E, para mim, as fotografias mais valiosas que tenho remetem-me para momentos, vivências, com a família e os amigos. E, portanto, são todas essas. Num contexto não familiar ou sentimental, talvez escolhesse uma panorâmica da ilha de São Jorge, também obtida com o drone.

Primeiro porque é um enquadramento imponente de um local que adoro. E depois porque foi uma fotografia selecionada para ser publicada na revista National Geographic em 2021 o que, para um leitor desde o número 1 em Portugal, foi um motivo de enorme regozijo. Claro que é um espaço para a fotografia dos leitores, criado exatamente para dar a oportunidade que qualquer pessoa possa ver uma foto sua publicada. Mas ter aquela revista tão especial na mão, com uma fotografia minha que eu adoro… não tem preço. E depois poder levar para a escola, mostrar aos alunos a fotografia do «stôr» na revista que por vezes usávamos para consultar artigos e discutir assuntos nas aulas. Foi neste momento que terei começado a tomar consciência mais efetiva do potencial que a minha própria fotografia de natureza, ainda mais em disciplinas como as que leciono, tem o poder de envolver os alunos de forma muito mais significativa.    

MN: Foi algo inolvidável. Principalmente pelas vivências desse fim de semana. Nunca tinha ido, nem sequer como espectador, a um Festival de Imagem de Natureza e só agora me comecei a aperceber que existem vários com bastante relevância e tradição em Portugal. E essa experiência, por si só, valeu muito mais que qualquer prémio: foram momentos em que pudemos entrar um pouco no mundo que as imagens de fotógrafos de natureza consagrados, nacional e internacionalmente, partilharam connosco. E foi onde, realmente, me apercebi que aquele chavão da “história por detrás da imagem” é tão, ou até mais importante, do que a própria imagem em si. Permite-nos vivenciar e sonhar realidades que não são as nossas. E é aí que entra o verdadeiro poder da fotografia de natureza: transportar-nos, com uma dose de realismo da imagem e outra de sonho pelas nossas vivências, para os lugares pacíficos onde a mente nos levar. E cada um de nós terá uma viagem e destino diferentes. Mesmo partindo da mesma fotografia.

Com a premiação desta fotografia da Falésia, e com a de um falcão finalista na categoria Aves,

participei no Insitu num painel que conta a tal “história por detrás da imagem”, onde tive a oportunidade de revelar aos presentes uma praia da Falésia, e até um Algarve, que poucos experienciam: no sítio onde todos os dias há mergulhos mil, um sol escaldante e deliciosas bolinhas de berlim, há toda uma azáfama biogeológica a ocorrer num incrível ecossistema! Muitas pessoas nem sabem, mas há raposas, há falcões, há corujas… a Falésia palpita de vida! E é também por isso que uma fotografia singular de uma praia pode perfeitamente vencer um concurso de fotografia de natureza.

MN: A minha relação com concursos não é próxima. Cheguei a participar, por exemplo, em alguns concursos do CISE, tendo, inclusive, obtido um primeiro e um segundo prémio, se não estou enganado. Desde o ano passado, quando comprei material fotográfico mais dedicado à exploração da vida selvagem, comecei a entusiasmar-me, novamente, com a fotografia e a participar, então, nestes eventos, tendo sido premiado no Rewilding Portugal 2024 e, agora, no Insitu.

Confesso que nunca levei a fotografia muito a sério, nesse sentido, e não sei se essa relação vai mudar.

Talvez agora ainda sinta uma espécie de aura e motivação especial pela participação no Insitu e pela possibilidade que me foi dada de partilhar histórias pela fotografia. Isso, sim. Posso dizer que é algo novo que me fascinou e que eu não sabia que iria apreciar tanto. Foi uma descoberta. Se tiver que ser pela via dos concursos, logo se vê. Mas a ideia de comunicar história pela fotografia é algo que me apela, talvez, também, por, de certa forma, já o fazer na minha profissão. Vamos ver. Não quero limitar muito a minha liberdade fotográfica. Ainda estou em fase de grande deslumbramento pela fotografia de natureza e a tentar perceber onde este sentimento me leva.

Em termos de exposições, nunca fiz nada individual. Lembro-me de ter colaborado com algumas fotografias numa exposição fotográfica relacionada com o Ambiente quando lecionei na Escola Evaristo Nogueira.

Na minha escola atual temos, também, uma exposição em vista, pegando em fotografias que eu e um amigo fomos registando no último ano sobre a fauna da Lagoa dos Salgados, em Albufeira, e que estão a servir de base para trabalhos artísticos em disciplinas como Educação Visual, num projeto que visa apelar à conservação e proteção daquela importante zona húmida que se encontra ameaçada pela possibilidade de construções na área.

E perspetivando o futuro da minha fotografia, se é que posso pensar assim, penso que será por aí que tenderei a valorizá-la: enquanto forma de revelar, mostrar e tentar impactar, pelos meios que me forem possíveis, no âmbito da Conservação do Património Natural.

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